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Monitor de Dados Socioambientais, iniciativa do projeto Achados e Pedidos, da Abraji, Transparência Brasil e Fiquem Sabendo, cobra explicações sobre medidas preventivas desde agosto
Por Taís Seibt*
Faltando cinco dias para as eleições municipais de 2020, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) finalmente publicou um conjunto de medidas sanitárias para evitar contaminação pelo novo coronavírus em áreas indígenas durante a votação do próximo domingo (15.nov.2020). Divulgado na noite de segunda-feira (09.nov.2020), o conteúdo foi retirado do ar na manhã seguinte, devido a um erro técnico, conforme informou a assessoria de imprensa do TSE.
O texto foi recolocado no site às 14h30min de terça-feira (10.nov.2020), porém informando o número errado da Portaria. A notícia do TSE diz que “as medidas estão contempladas na Portaria 182”, sendo que se trata da Portaria 812, publicada na edição extra do Diário da Justiça de 10 de novembro. O documento não tem acesso público no site do TSE, é preciso que o usuário marque a opção “não sou um robô” para ler a portaria, o que é um entrave para a transparência das informações. O documento pode ser acessado de forma mais simples neste link no site Achados e Pedidos.
A indefinição das políticas não se restringe a falhas na publicação, a demora em passar orientações claras sobre os procedimentos preventivos, o que só ocorreu agora, na véspera do pleito, preocupa especialistas.
Desde agosto, o Monitor de Dados Socioambientais para o projeto Achados e Pedidos, tenta detalhar as medidas para garantir o voto seguro nessas comunidades por meio de pedidos de Lei de Acesso à Informação (LAI) a diferentes órgãos federais, sem sucesso. O Monitor, que acompanha políticas socioambientais no Brasil, é desenvolvido por Fiquem Sabendo, Transparência Brasil e Abraji, com financiamento da Fundação Ford.
Em pedidos protocolados em agosto e outubro, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) informou que a consultoria contratada para fazer o plano de segurança sanitária do processo eleitoral estava “realizando estudos sobre protocolos específicos, inclusive relativos à votação de povos indígenas” e que os estudos seriam “amplamente divulgados” quando concluídos. No Plano de Segurança Sanitária do TSE, as poucas menções a indígenas e quilombolas versam sobre questões genéricas como “garantir proteção adicional para pessoas com maior risco de quadros graves da Covid-19”, incluídas essas comunidades, para as quais “há previsão de recomendações específicas”. No documento, tais recomendações se resumem a: “Evitar campanha presencial e distribuição de material impresso para comunidades indígenas e quilombolas”. Somente nesta semana foram publicadas recomendações detalhadas.
Questionado sobre a quantidade de seções e eleitores em áreas indígenas e quilombolas, o TSE respondeu que o tribunal “não dispõe da informação de seções localizadas nessas comunidades” e indicou a consulta ao Repositório de Dados Eleitorais, onde se pode ver as estatísticas do eleitorado por local de votação, porém não há filtros específicos para apurar quais estão em áreas indígenas ou quilombolas. Em outras palavras, nem a Justiça Eleitoral sabe quantos eleitores indígenas e quilombolas votarão neste domingo, o que levanta dúvidas quanto ao real impacto da portaria.
A Fundação Nacional do Índio (Funai), por sua vez, alegou não ter competência sobre o tema, afirmando que “compete à Justiça Eleitoral providenciar e garantir os direitos dos eleitores indígenas a terem acesso ao pleito” e que os “tribunais podem solicitar apoio logístico e operacional à Funai”. Disse ainda que cabe à Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), do Ministério da Saúde, os “cuidados relativos à pandemia conforme as especificidades de cada região e etnia”. Via assessoria de imprensa, na última quarta-feira (4.nov.2020), a Sesai mencionou a elaboração da portaria, agora publicada pelo TSE, visando à “prevenção do contágio e da disseminação da Covid-19 entre os povos indígenas”.
Para Juliana Batista, advogada do Instituto Socioambiental (ISA), tanto TSE quanto Funai têm responsabilidades. “Espera-se que as medidas de segurança e acesso às seções eleitorais ainda possam ser adotadas pelo TSE e implementadas pela Funai, que é o órgão que tem de fato competência legal para execução de política indigenista”, destaca. Ela ressalta que existem necessidades específicas para garantir o direito para o acesso aos votos dessas comunidades, sobretudo em um contexto de pandemia.
Segundo a Rede Wayuri, composta por 17 comunicadores indígenas de oito etnias que acompanham as eleições 2020 em São Gabriel da Cachoeira — a cidade com a maior população indígena do Brasil —, alguns indígenas da região precisam se locomover por até três dias para chegar à seção eleitoral mais próxima. “Pelo que vem sendo debatido na assembleia da juventude da FOIRN (Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro), o processo eleitoral é importante para os gestores prestarem conta sobre suas administrações e também para aumentar a participação das comunidades indígenas e da própria Rede Wayuri”, pontua a comunicadora Daniela Patricia, da etnia Tukano.
Além de recomendações para mesários cujas seções estão em territórios indígenas, que são basicamente o reforço ao uso de equipamentos de proteção e cuidados com higienização, a portaria publicada pelo TSE prevê que, nas unidades eleitorais instaladas fora dessas áreas, “os eleitores autodeclarados indígenas terão preferência para votar” e os tribunais regionais eleitorais devem dar “ampla divulgação desse direito de preferência junto a servidores e mesários”.
Funai e Fundação Palmares foram procuradas durante uma semana para detalhar informações, mas não responderam aos questionamentos da reportagem até o fechamento.
*com apoio de Pedro Teixeira, estagiário da Abraji
Veja todas as respostas no Achados e Pedidos:
Funai (NUP 08850005326202086)
TSE (Protocolo 44009414124919)
TSE (Protocolo 429790)
Conheça o projeto “LAI e FOIA: diálogos transparentes Brasil-EUA”, realizado pela Fiquem Sabendo com apoio International Center For Journalists (ICFJ). A iniciativa busca aproximar a Lei de Acesso à Informação (LAI) de sua correspondente norte-americana, o Freedom of Information Act (FOIA), de forma a trocar experiências e ampliar o acesso à informação no Brasil.
Assista às entrevistas já produzidas com apoio do ICFJ:
Acesse os guias que produzimos para o projeto:
Veja os outros textos que traduzimos:
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Este conteúdo saiu primeiro na edição #66 da newsletter da Fiquem Sabendo, a Don’t LAI to me. A newsletter é gratuita e enviada quinzenalmente, às segundas-feiras. Clique aqui e inscreva-se para receber nossas descobertas em primeira mão também.