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Relatório final da Marinha conclui ainda que quase 17 mil funcionários públicos foram envolvidos diretamente no combate ao desastre em 2019 e aponta ações necessárias para evitar acidentes futuros
Por Maria Esperidião e Fiquem Sabendo
O governo federal envolveu diretamente 16,8 mil funcionários e gastou R$ 187,6 milhões para combater o maior derramamento de óleo da história na costa brasileira, ocorrido no segundo semestre de 2019. Os dados constam no documento solicitado à Marinha pelo Monitor de Dados Socioambientais, iniciativa do projeto Achados e Pedidos, desenvolvido pela Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo), Transparência Brasil e Fiquem Sabendo.
No fim de agosto, o G1 divulgou o relatório preliminar da Marinha com dados parciais. A investigação terminou sem apontar culpados ou a origem do maior desastre de vazamento de óleo do país. E provocou uma série de questionamentos se as medidas tomadas por parte do governo foram proporcionais aos danos causados.
O relatório final da Marinha obtido pelo Monitor, assinado no dia 09 de outubro de 2020 pelo Almirante de Esquadra Marcelo Francisco Campos, contém os valores empregados no Plano Nacional de Contingência (PNC), total de funcionários mobilizados e cinco ações propositivas que “permitirão ao Estado atuar preventivamente, respondendo com maior eficiência às ameaças e emergências”.
Entre agosto de 2019 e março de 2020, quando acabou o PNC para mitigar os efeitos do vazamento, o governo federal empregou 16.848 funcionários de sete órgãos federais - a maior parte (7.000) da Marinha, seguido pelo Exército (5.000) e pela Defesa Civil (3.873). O menor número de pessoal no PNC veio do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio): 100 servidores.
Os servidores alocados no PNC foram distribuídos em quatro fases: monitoramento, acompanhamento, avaliação, recolhimento e destinação. Para o transporte de tamanha equipe, foram usados diversos meios de transporte, mobillizando 51 navios, 24 aeronaves e 180 veículos terrestres, além do "grande número de embarcações de menor porte, tais como lanchas, botes e motos-aquáticas utilizadas pela Marinha e pelo ICMBio".
Somados todos gastos empregados na contenção do óleo, o desastre custou custou R$ 187, 6 milhões aos cofres públicos. O gráfico a seguir detalha os valores:
Uma tragédia sem precedentes
O relatório aponta que desde 2013 a Marinha do Brasil (MB), o Instituto Brasileiro
do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) e a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) já realizavam "treinamentos e simulados próprios, além de terem participado de diversos exercícios conduzidos por empresas de exploração de petróleo que, eventualmente, evoluíram para treinamentos e simulações com instituições internacionais".
O órgão afirma, portanto, ter se preparado para incidentes com descargas de óleo de significância nacional. Entretanto, nenhuma das simulações com especialistas internacionais havia contemplado um cenário semelhante ao que seria enfrentado no acidente ocorrido em 2019. A Marinha concluiu que o incidente tinha “dimensões e características próprias, que o distinguiram dos usuais derramamentos de óleo ocorridos no Brasil e no mundo”.
O documento aponta que ao todo 1.009 localidades foram afetadas, em 130 municípios e 11 estados. “Assim, apesar dos numerosos exercícios previamente realizados e da existência de protocolos internacionais consagrados para a resposta a incidentes de derramamento de óleo, o ineditismo do incidente em lide demandou a adoção de novas metodologias”.
Além do tamanho, outras particularidades dificultaram a contenção da tragédia, como a distância da costa na qual o óleo foi descarregado. "Esse fato e a presença das correntes Sul-equatorial, das Guianas e do Brasil contribuíram para o grande espalhamento do produto". Para piorar, o óleo não se deslocava na superfície da água, impossibilitando que as manchas fossem detectadas por radares satelitais, por sensores especializados ou sobrevoos. "Tais situações singulares tiveram como efeito prático a impossibilidade de uso e/ou a ineficácia de algumas técnicas e equipamentos tradicionalmente usados para detecção e combate a derramamento de óleo", conclui o documento.
Em paralelo ao PNC foi acionado o Plano Nacional de Ação de Emergência para Fauna Impactada por Óleo (PAE Fauna). No total, foram registrados "159 animais oleados na costa brasileira, sendo 47 encontrados vivos e 112 mortos. As tartarugas marinhas foram os animais mais afetados, com 105 registros, seguidas das aves, com 39 registros".
Medidas de prevenção
O texto deixa claro que o PNC não prevê dinheiro ou equipamentos para evitar outro episódio semelhante, mas propõe uma série de ações para evitar novos desastres. A Marinha sublinha que identifica no incidente um potencial risco à segurança nacional: "nas relações internacionais no século XXI ocorre o desenvolvimento das guerras híbridas, onde várias ações podem ser executadas para prejudicar uma nação, destruindo seus recursos naturais, com graves prejuízos ambientais e, paralelamente, gerando prejuízos socioeconômicos de dimensões incalculáveis".
Em âmbito internacional, considerando a origem do óleo - um navio estrangeiro distante da costa - a Marinha recomenda a revisão das normas da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar. “O atual conceito internacional de liberdade de navegação tem gerado um espaço marítimo onde impera a desordem e o caos, cabendo a formulação pelo Poder Executivo de propostas de alterações/emendas à Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar e às Convenções firmadas sob a égide da IMO – Organização Marítima Internacional (SAR, SOLAS, MARPOL73/78 e INTERVENTION), de forma a estabelecer a obrigatoriedade do compartilhamento”.
Na esfera nacional, a Marinha sugere a criação da Comissão Técnico-Científica para o Monitoramento e a Neutralização dos Impactos Decorrentes da Poluição Marinha por Óleo e outros Poluentes na Amazônia Azul, "por meio de sua formalização, planeja-se edificar a estrutura para a futura implantação do Instituto Nacional do Mar (INMAR), originalmente concebido como Instituto Nacional de Pesquisas Oceânicas (INPO), a ser futuramente qualificado como Organização Social (OS) pelo MCTI.
O órgão recomenda ainda a aquisição de novos equipamentos para enfrentar desastres nos próximos dez anos, com investimento previsto de R$ 2 bilhões. Entretanto, o documento não menciona se há previsão orçamentária para a compra, nem cronograma para a aquisição.
Conheça o projeto “LAI e FOIA: diálogos transparentes Brasil-EUA”, realizado pela Fiquem Sabendo com apoio International Center For Journalists (ICFJ). A iniciativa busca aproximar a Lei de Acesso à Informação (LAI) de sua correspondente norte-americana, o Freedom of Information Act (FOIA), de forma a trocar experiências e ampliar o acesso à informação no Brasil.
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Este conteúdo saiu primeiro na edição #66 da newsletter da Fiquem Sabendo, a Don’t LAI to me. A newsletter é gratuita e enviada quinzenalmente, às segundas-feiras. Clique aqui e inscreva-se para receber nossas descobertas em primeira mão também.