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Acessamos relatório de inteligência do Centro de Crimes e Narcóticos da CIA, classificado como secreto até a liberação pela equipe do MuckRock, site norte-americano especializado em transparência de dados. Datado de 29 de janeiro de 199, o documento analisa o cenário do narcotráfico no Brasil e as políticas de enfrentamento do então presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC).
O MuckRock é uma organização americana especializada na Lei de Acesso à Informação dos Estados Unidos (Freedom of Information Act, ou FOIA). Desde o início do ano passado a Fiquem Sabendo é parceira oficial do MuckRock, com acesso e direito de republicação do material produzido pela entidade.
Acesse a íntegra do documento aqui.
O documento aponta a corrupção de autoridades oficiais e o desgaste do presidente da República entre os líderes do Congresso como os principais obstáculos para o sucesso da política de combate ao tráfico de drogas no território brasileiro na década de 90.
Traduzimos o documento para o projeto "LAI e FOIA: diálogos transparentes Brasil-EUA", realizado com apoio do International Center for Journalistas (ICFJ) - instituição global para promoção do jornalismo.
Mantendo-se vigilante em relação aos empenhos brasileiros no tocante à política antidrogas, o Relatório de Inteligência da CIA também detalha a ofensiva da gestão Cardoso, que investiu na importância do papel das Forças Armadas para combater o narcotráfico. “Em março de 1998, o Presidente Cardoso assinou legislação autorizando a Força Aérea a atacar aeronaves ilegais que não respondem a ordens de pouso”, discorre o texto, que destaca ainda o fato do então presidente não ter assinado até aquele momento regras oficiais de compromisso para pilotos de interdição da Força Aérea.
A legislação mencionada refere-se à Lei do Abate, ou Lei do Tiro de Destruição, que entrou em vigor em 2004, ao ser regulamentada pelo governo Lula. Na prática, a lei autoriza a derrubada de aviões considerados suspeitos de servirem ao narcotráfico e hostis à segurança nacional, e já foi alvo de intensos debates quanto à sua constitucionalidade. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o primeiro a assiná-la, conforme relata o texto, já revelou que inclusive mudou de opinião sobre a questão das drogas desde o final do seu mandato e passou a defender a descriminalização.
Documentos revelados pela WikiLeaks em 2010 apontam que o governo brasileiro permitiu inspeções periódicas de autoridades norte-americanas no Brasil para deliberar sobre a aplicação da lei. Em março deste ano, a Força Aérea Brasileira interceptou um avião de pequeno porte considerado irregular que sobrevoava o Mato Grosso e, em abril de 2018, chegou a atirar em um avião suspeito de tráfico de drogas no Mato Grosso do Sul. A legislação, entretanto, nunca foi aplicada para destruir aeronaves.
O relatório da CIA aponta ainda para o financiamento americano de estratégias para o combate às drogas no Brasil. “Brasília também adotou uma variedade de iniciativas sociais voltadas à redução da demanda de narcóticos, em cooperação com programas e políticas financiados pelos EUA”, verifica o texto, que registra insatisfação com os empreendimentos brasileiros. “O Brasil frequentemente registra sucessos escassos na frente da interdição, e os resultados de 1998 foram igualmente insignificantes”, completa. A aposta da organização americana, conforme indica o documento, é no fortalecimento da legislação. “A antecipação da passagem da lei antidrogas coletiva pendente e os esforços para conter brigas burocráticas e reduzir a corrupção oficial, especialmente no sistema judicial e entre as autoridades policiais estaduais e municipais, também deve oferecer oportunidades para demonstrar um compromisso antinarcótico contínuo”, conclui.
Em 2002, Fernando Henrique Cardoso assinou um decreto estabelecendo as diretrizes para a Política Nacional Antidrogas, revogado por Bolsonaro em 2019. A medida do atual presidente colocou em vigor a Política Nacional sobre Drogas, alvo de críticas por adotar a abstinência como principal estratégia e retirar menção à política de redução de danos como alternativa.
Acesse a íntegra do documento aqui.
Assista às entrevistas já produzidas com apoio do ICFJ:
Veja os outros textos que traduzimos:
Veja outros documentos liberados pelo MuckRock:
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Este conteúdo saiu primeiro na edição #66 da newsletter da Fiquem Sabendo, a Don’t LAI to me. A newsletter é gratuita e enviada quinzenalmente, às segundas-feiras. Clique aqui e inscreva-se para receber nossas descobertas em primeira mão também.