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Decisão favorável e irrecorrível do tribunal inclui todas as remunerações e é aplicável a todas as empresas estatais, incluindo as de economia mista, em regime de concorrência e com capital aberto
Após a Fiquem Sabendo (FS) denunciar a falta de transparência das empresas estatais federais em relação à remuneração de seus empregados, o Tribunal de Contas da União (TCU) decidiu que essas instituições devem informar a remuneração nominal e individualizada de seu quadro de funcionários. A decisão do TCU deve ser cumprida tendo em vista que as possibilidades de recurso no tribunal foram esgotadas.
Passados três anos e três meses da denúncia da FS, protocolada em 3 de novembro de 2020, o órgão de controle externo do governo federal confirmou que a transparência das informações sobre remuneração em empresas estatais não pode ser diferente do restante da administração pública federal.
A importância dos dados
Ao não divulgar ou dificultar o acesso às informações de remuneração do quadro de funcionários, as empresas estatais inviabilizam o controle social, que depende da disponibilidade de dados. Esse é o entendimento que levou a FS a agir:
Independentemente de serem dependentes ou não do Tesouro Nacional ou atuarem ou não em regime de concorrência, essas empresas devem cumprir o que determina a Lei de Acesso à Informação (LAI) e entendimentos do STF e TCU.
"Em primeiro lugar, a decisão aprimora a accountability das estatais, estimulando a percepção de transparência e prestação de contas pelos agentes públicos. Em segundo, fortalece a regra geral de que transparência é a regra e sigilo a exceção. Em terceiro, dá tratamento isonômico à questão para todos os agentes públicos, sejam eles empregados ou servidores.", afirma Bruno Morassutti, cofundador e diretor de advocacy da Fiquem Sabendo, responsável pela mobilização no tribunal.
A relevância de tornar pública a remuneração desses agentes é ainda mais significativa devido ao expressivo volume de recursos públicos envolvidos – que chegaram a R$113,71 bilhões apenas em 2019, segundo o Ministério da Economia – e um significativo número de remunerações praticadas bem acima da média do mercado, segundo levantamento realizado pelo TCU, base do seu Acórdão nº 728/2019, relatado pelo ministro Vital do Rêgo.
Dessa forma, a decisão do TCU pode ser considerada uma vitória histórica da transparência pública! “As estatais estão no centro dos grandes casos de corrupção que acompanhamos nos últimos anos; é essencial que a sociedade possa fiscalizar a remuneração dos servidores para prevenir os riscos – e não só correr atrás do prejuízo”, destaca Maria Vitória Ramos, cofundadora e diretora executiva da Fiquem Sabendo.
Apesar da determinação firme do TCU, existe um risco real de descumprimento por parte dessas instituições. Diante desse contexto, torna-se fundamental a fiscalização ativa por parte dos cidadãos!
TCU estabelece regras claras
O Supremo Tribunal Federal (STF) já havia firmado em 2011 um precedente no sentido de que “é legítima a publicação, inclusive em sítio eletrônico mantido pela Administração Pública, dos nomes dos seus servidores e do valor dos correspondentes vencimentos e vantagens pecuniárias”.
Ao percebermos na prática que as decisões estavam sendo descumpridas, decidimos protocolar uma denúncia sobre o assunto no Tribunal de Contas da União, buscando contribuir com as discussões em andamento no órgão de controle.
A transparência da remuneração nas empresas estatais também havia sido debatida no Acórdão 1.523/2019, relatado também por Vital do Rêgo, e no Acórdão 1.338/2022, relatado pelo ministro Walton Alencar Rodrigues – que ratificaram a posição do tribunal em relação à publicidade das informações sobre cargos e salários.
No final de 2023, com o fim da possibilidade de novos recursos das empresas no tribunal, o assunto foi esgotado no TCU. As empresas precisam agora cumprir as regras gerais de transparência previstas na Lei de Acesso à Informação (LAI).
O Acórdão nº 728/2019 aponta, inclusive, que a Secretaria de Coordenação das Estatais (Sest) deve ainda “adotar ações junto às empresas estatais para promover a necessária transparência e publicidade das despesas relacionadas à remuneração dos seus empregados e dirigentes”.
A decisão deixa claro que as informações devem ser individualizadas e abranger:
Decisão inclui empresas em regime de concorrência, economia mista e com capital aberto!
Para negar as obrigações de transparência, as estatais costumam alegar que isso prejudicaria a capacidade de concorrência com empresas privadas ou, no caso de empresas de economia mista cotadas na Bolsa de Valores, como Petrobras e Banco do Brasil, estariam sujeitas a seguir regras da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que, na verdade, não disciplina esse tipo de assunto.
Veja como o Banco do Brasil trata do assunto em seu portal: “O Banco do Brasil é uma sociedade de economia mista que atua em regime de concorrência, sendo suas relações empregatícias sujeitas as normas da iniciativa privada, e protegidas pelo sigilo estratégico” (destacamos que não existe legalmente o conceito de “sigilo estratégico”). A justificativa da instituição financeira para não divulgar os dados prossegue: “empresas públicas, sociedades de economia mista e demais entidades controladas pela União, que atuam em regime de concorrência, não são obrigadas a disponibilizar as informações referentes aos seus empregados”.
Caixa Econômica Federal:
E ainda da Petrobras:
A justificativa das empresas não foi aceita pelo tribunal neste último julgamento:
“Nenhuma dúvida há de que as empresas públicas e sociedades de economia mista que atuem em concorrência também estão sujeitas às obrigações de divulgação das remunerações de seus empregados.”
- Acórdão 728/2019 e reproduzida no Acórdão1338/2022.
A cofundadora e diretora executiva da FS reforça: “É importante destacar que, apesar do regime de concorrência, as estatais já dispõem de diversas vantagens pela associação com o poder público. Benefícios devem ser acompanhados de responsabilidades. Onde há dinheiro e esforço do governo há também a obrigação de prestar contas aos contribuintes.”
Próximos passos
As estatais não vão atender à decisão do TCU sem pressão direta. Foi assim com todas as vitórias da Fiquem Sabendo no tribunal. Por isso, já solicitamos via LAI todos os dados necessários para cumprimento da decisão. E como sempre, você, leitor desta newsletter, vai receber todos os resultados em primeira mão!
Já fizemos pedidos para todas as estatais federais e temos 17 pedidos em fase de recurso na 1ª instância, oito recursos de 2ª instância e quatro recursos para a Controladoria-Geral da União (CGU). Ao todo, são quase uma centena de demandas em tramitação. Até o momento, três empresas atenderam integralmente os pedidos feitos pela FS: Companhia de Docas do Ceará, Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (CEAGESP) e NAV Brasil Serviços de Navegação Aérea S.A. – os dados serão disponibilizados na próxima edição.
Já a Empresa Brasil de Comunicação (EBC) negou os pedidos alegando que a ferramenta de controle utilizada pela empresa “tem funcionalidades primordialmente concebidas ao gerenciamento de empresas privadas, de maneira que o sistema não é concebido para a extração de dados na formatação típica da administração pública e com as particularidades delineadas pela LAI”. Felizmente, no dia 31 de janeiro, a CGU atendeu o recurso da Fiquem Sabendo e determinou que a empresa deve fornecer “nome completo, CPF descaracterizado, emprego, função, lotação, remuneração bruta, acréscimos à remuneração, descontos legais e remuneração líquida, no período de 2017 a 2023, em formato aberto”. Aguardamos o envio dos dados!
Além disso, vamos continuar cobrando melhorias e aprimoramento da transparência:
Nota da direção
“Essa é mais uma conquista histórica da Fiquem Sabendo com potencial de economizar milhões e até bilhões de reais aos cofres públicos!”, destaca Maria Vitória Ramos. Quem acompanha essa newsletter sabe que, em 2020, abrimos as pensões e aposentadorias de inativos de todos os servidores civis da União e, em 2021, todos os benefícios pagos aos familiares de militares. Conseguimos todos os pagamentos feitos nos últimos 27 anos, totalizando R$ 480 bilhões em valores líquidos feitos sem nenhuma transparência. Esse esforço economiza pelo menos R$ 6 milhões por ano, segundo estudo preliminar da Controladoria-Geral da União (CGU).
Em 2022, publicamos os gastos com cartão corporativo de todos os ex-presidentes pela primeira vez na história e, no ano passado, as notas fiscais dos gastos do presidente Bolsonaro e seu vice, Hamilton Mourão. As notas fiscais estão disponíveis com exclusividade no Document Cloud (saiba como conseguimos os dados aqui), plataforma do MuckRock – principal organização de Acesso à Informação nos Estados Unidos e financiadora do projeto.
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