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Entenda o que são os "100 anos de sigilo" previstos na Lei de Acesso à Informação

Equipe Fiquem Sabendo

Publicado em: 07/10/2022
Atualizado em: 10/03/2023

A Fiquem Sabendo separou uma lista de fatos sobre as regras de sigilo na LAI para ajudar nossos leitores a entender melhor o tema dos "100 anos de sigilo" / artigo 31: 

  1. Quando se fala em sigilo de 100 anos, trata-se do artigo 31 da Lei de Acesso à Informação, que diz que informações pessoais "terão seu acesso restrito, independentemente de classificação de sigilo".  Este dispositivo é ativado, em geral, mediante provocação de algum cidadão - pede-se a informação por meio da LAI e o governo pode dar acesso ou negar. 
  1. Quem define se uma informação é pessoal ou não, no dia a dia, são servidores públicos que trabalham nos chamados Serviços de Informação ao Cidadão, ou SIC, que são canais que recebem pedidos de informação de cidadãos ao governo. 
  1. Os servidores tomam como base como o próprio governo já decidiu sobre temas parecidos no passado. A regra sobre o que configura uma informação pessoal não é muito clara no texto da lei. As interpretações variam: alguns órgãos entendem, por exemplo, que divulgar CPFs, mesmo de forma mascarada (ex: ***325.543*****), é uma informação pessoal, enquanto outros abrem esse tipo de dado. Esses entendimentos também variam com o tempo: o Ministério da Economia divulgava o nome de pessoas e empresas autuadas por trabalho escravo, mas passou a negar esta informação a partir de 2021 com base no artigo 31 e na Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
  1. Quando se nega uma informação por ser pessoal, não se trata de um decreto de sigilo, mas de uma decisão administrativa tomada por um servidor. Ela pode ser revogada por seu supervisor hierárquico ou pela Controladoria-Geral da União (CGU), que é um órgão técnico e cujas decisões passam por análise de servidor de carreira (ainda que o ministro seja nomeado pelo presidente). Veja, por exemplo, este caso em que o GSI tentou negar acesso ao registro de entrada e saída de uma pessoa no Palácio do Planalto, mas. com recursos, a decisão foi revertida pela CGU e o dado foi fornecido.
  1. Segundo estes pesquisadores, negativas de acesso a informações consideradas pessoais não podem ser revogadadas por decreto, mas somente por outras decisões administrativas.
  1. Existem pelo menos três tipos de sigilo, de forma resumida: a) o da informação pessoal, que é o único que prevê a guarda do documento por até 100 anos; b) o de informações classificadas por uma autoridade nos termos da Lei de Acesso à Informação, que pode ser de 5, 15 ou 25 anos (selos reservado, secreto e ultrassecreto); e c) a proteção legal prevista por outras leis, que é um sigilo por tempo indeterminado. Neste último caso, isto significa que, se alguma lei diz que uma informação é sigilosa (ex: sigilo bancário ou fiscal), a LAI não estará acima daquela lei. 
  1. A forma de negar acesso a informações públicas mais comum ainda é o artigo 31 da LAI (informação pessoal), mas esta estratégia tem perdido espaço para outras formas de negativa. como o uso de outras leis e a classificação do documento nos termos da própria LAI como reservado, secreto ou ultrassecreto. Não é incomum, inclusive, que o órgão negue informações parecidas de formas diferentes ao longo do tempo. Pedidos por acesso a registros de entrada no Palácio do Planalto, por exemplo, ora são negados com base no artigo 31, ora negados com base em uma classificação do documento como reservado (portanto em sigilo por 5 anos, e não "até 100").
  1. O artigo 31 da LAI, que trata das "informações pessoais", ganhou nova força com a regulamentação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) que, desde 2020, vem sendo usada (de forma “requentada”) também como forma de negar informações. Novamente, estes casos não se tratam de um decreto, mas uma decisão administrativa para negar um pedido de informação. Estudo feito pela Fiquem Sabendo e pelo Insper mostra um cenário de atenção, mas ainda distante do caos: há poucos pedidos que, de fato, foram negados com base na LGPD, embora os casos estejam ficando cada fez mais comuns.

A Fiquem Sabendo fez ainda um levantamento nos microdados da CGU e identificou que, desde 2015, cerca de 7 mil pedidos de informação foram negados com base na alegação de que haveria informações pessoais nos documentos solicitados. Segundo o artigo 31 da Lei de Acesso à Informação, informações consideradas pessoais podem ficar em segredo por até 100 anos, embora a legislação não explique como se calcular um prazo exato.

A negativa por informação pessoal é uma decisão administrativa, tomada por servidores que atuam nos chamados Serviços de Informação ao Cidadão (SIC), departamentos que operam a Lei de Acesso à Informação dentro de cada órgão público. 

Esta negativa pode ser derrubada a qualquer momento por outra decisão administrativa, seja do servidor hierarquicamente superior ao que negou a informação ou por decisão da Controladoria-Geral da União (CGU), no caso do governo federal (para estados e municípios há geralmente uma ouvidoria ou controladoria para avaliar estes casos).

A maioria dos pedidos identificados como pessoais são solicitações do próprio requerente da informação, como pessoas querendo saber sobre a própria aposentadoria, quando receberão a parcela do auxílio emergencial, dados sobre passaporte, dentre outros. Mas também há casos de pedidos por informações sobre visitas a órgãos públicos, relatórios de investigações e sindicâncias contra servidores públicos.

Nuvem de palavras com os termos mais comuns em pedidos negados por conter informação pessoal (Fonte: Fiquem Sabendo, com dados da CGU)

Uma dica que costumamos dar aos nossos leitores para superar este tipo de barreira é pedir que o órgão envie o documento com uma tarja somente na parcela que contém informações pessoais. Veja mais detalhes aqui. Esta estratégia segue o que diz o artigo 7 da lei - § 2º Quando não for autorizado acesso integral à informação por ser ela parcialmente sigilosa, é assegurado o acesso à parte não sigilosa por meio de certidão, extrato ou cópia com ocultação da parte sob sigilo.

Veja a íntegra do texto dos pedidos aqui. 

Também deixamos público o código em Python usado para obter os dados - e que pode ser atualizado por qualquer pessoa com conhecimento da linguagem.

A fonte dos dados é a base de dados abertos da Controladoria-Geral da União(CGU).

É importante reforçar que os dados representam apenas uma parte dos pedidos negados. A categorização da negativa como informação pessoal é do próprio servidor, portanto é possível - e nem tão incomum - que pedidos sejam categorizados de outra forma, mesmo quando parte ou até a informação total é negada com base no artigo 31 da LAI. Uma informação negada pode ser classificada, por exemplo, como "pedido desarrazoado" ou " não se trata de solicitação de informação", fugindo do escopo deste levantamento.


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