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Este é um conteúdo traduzido livremente pela equipe da Fiquem Sabendo a partir da publicação original do South South North. A versão original, em inglês, está disponível aqui.
Em 2023, a meta global de temperatura do Acordo de Paris, de 1,5°C, foi ultrapassada pela primeira vez. Um ano depois, o mundo enfrentou o ano mais quente da história, e uma série de desastres climáticos causou severas perdas econômicas e de vidas em todo o globo. No final do ano passado, todas as atenções se voltaram para a COP29, conhecida como a "COP do Financiamento", na expectativa de um avanço urgente no compromisso de ampliar a provisão de financiamento climático — até então insuficiente para atender sequer a uma fração das necessidades dos países em desenvolvimento. No entanto, o Novo Objetivo Coletivo Quantificado (NCQG, na sigla em inglês) para o financiamento climático gerou grande decepção e frustração, ficando muito aquém da urgência exigida pela crise climática.
Em 2025, os países do Sul Global enfrentam desafios ainda maiores, com o congelamento do financiamento dos Estados Unidos e a retirada do país do Acordo de Paris, causando efeitos colaterais devastadores para o clima e a saúde. Essas crises evidenciam a necessidade de uma mudança radical: internalizar o financiamento do desenvolvimento e centrar mecanismos de transparência e accountability na agenda financeira multilateral, especialmente no que diz respeito ao financiamento climático. Ao fortalecer mecanismos de transparência e accountability nos processos de orçamento e políticas públicas e aumentar a visibilidade desses sistemas, a sociedade civil pode defender seus interesses com mais eficácia, além de desbloquear e direcionar novos e inovadores financiamentos climáticos para onde são mais necessários.
A Green Accountability coloca os cidadãos no centro dos processos de financiamento climático. Ela assegura que organizações da sociedade civil sejam envolvidas nas decisões que impactam diretamente suas vidas, que tenham acesso a informações climáticas atualizadas e confiáveis, e que os processos de orçamento e formulação de políticas públicas sejam inclusivos e fortalecidos pela participação popular. Dessa forma, os cidadãos são empoderados para assegurar o uso responsável dos recursos destinados ao clima e podem atuar de forma ativa e consciente nas ações de enfrentamento da crise climática.
Mecanismos mais eficazes de transparência e accountability tem o potencial de economizar mais de 100 bilhões de dólares por ano em financiamento climático público, além de garantir que esses recursos sejam distribuídos de forma mais justa, acessível e eficiente. No Sul Global, muitas comunidades e organizações da sociedade civil que estão na linha de frente da ação climática são frequentemente excluídas dos processos de governança e não recebem o apoio necessário para suas ações. Um exemplo claro dessa desigualdade são os povos indígenas, responsáveis pela proteção de cerca de 80% da biodiversidade mundial, e recebem apenas 1% dos recursos destinados ao financiamento climático. Cenários como esse, evidenciam a urgência de fortalecer os mecanismos de transparência e accountability, especialmente nos níveis subnacional e local, onde essas estruturas muitas vezes são inexistentes.
Por meio da Global Partnership for Social Accountability (GPSA) do Banco Mundial, a SouthSouthNorth (SSN), o World Resources Institute (WRI) e a Huairou Commission lançaram a Plataforma de Green Accountability, iniciativa que apoia 25 organizações beneficiárias em Bangladesh, Brasil, México, Senegal e Camarões na implementação de ações locais de accountability. A Plataforma também inclui uma Comunidade de Prática (CoP, na sigla em inglês), oferecendo um espaço de encontro para que os participantes compartilhem suas experiências e lições aprendidas na aplicação de mecanismos de accountability voltados à ação climática, incluindo o financiamento climático, além de fortalecer uma rede de atuação conjunta em defesa de temas prioritários nessa área.
A CoP é organizada em três Grupos de Afinidade, focado nos seguintes temas: transparência, financiamento climático e advocacy e engajamento. Esses grupos oferecem espaços para o compartilhamento de conhecimentos, a colaboração e a co-criação de soluções alinhadas aos projetos dos beneficiários, além de ampliar o acesso às melhores práticas globais e promover oportunidades de interação e colaboração com a comunidade internacional. A CoP oferece uma plataforma estratégica para dar visibilidade às ações de accountability em andamento no países participante. Por exemplo:
Embora a CoP tenha como objetivo valorizar as experiências nacionais no fortalecimento do accountability, ela também busca construir um movimento em torno da defesa de reformas no financiamento climático global, especialmente no período que antecede a 4ª Conferência da ONU sobre Financiamento para o Desenvolvimento (FF4D), as Semanas do Clima e a COP30, que ocorrerão em julho e novembro deste ano.
É cada vez mais importante que esses espaços garantam a integração das vozes locais em ações estratégicas para a provisão inovadora de financiamento climático, e que os processos de tomada de decisão sejam descentralizados — transferindo o poder para o desenvolvimento liderado localmente, capaz de promover mudanças reais.
Na 5ª Cúpula Finance in Common (FiCS), realizada na Cidade do Cabo em fevereiro, destacou-se o papel dos Bancos Públicos de Desenvolvimento (PDBs) como agentes de transformação. Discutiu-se que o cofinanciamento, a adoção de uma linguagem simples e a aproveitamento das vantagens comparativas e da diversidade dessas instituições são fatores essenciais para o avanço de uma agenda de financiamento climático mais inclusiva e justa. É fundamental garantir que os PDBs desenvolvam e cumpram mecanismos rigorosos de prestação de contas, como a aplicação de medidas de proteção ambientais e sociais, ferramentas de transparência e mecanismos de denúncia de irregularidades. Essas medidas podem assegurar a proteção das comunidades e dos recursos naturais tanto durante o desenvolvimento quanto na execução dos projetos.
Além disso, o acesso a dados de qualidade é essencial para viabilizar novas formas de financiamento da dívida, que hoje enfrentam preconceitos e são percebidas como altamente arriscadas — especialmente nos países do Sul Global. Para reverter esse quadro, é necessário que os modelos de classificação de risco de crédito reformulem seus critérios de avaliação, superando a dependência exclusiva de indicadores tradicionais como Produto Interno Bruto (PIB), saldo fiscal e dívida externa, e incorporando fatores que reflitam melhor a vulnerabilidade climática dos países.
Por exemplo, um estudo do International Institute for Environment and Development (IIED) sugere que, ao integrar medidas de alívio de dívida vinculadas a desastres nas avaliações de risco, as classificações de crédito dos Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento (SIDS) poderiam melhorar significativamente. Essas evidências apontam para a necessidade de flexibilizar e adaptar os mecanismos tradicionais de financiamento para garantir que a atual agenda de financiamento multilateral seja justa e responda às mais urgentes necessidades climáticas e de desenvolvimento.
Assim, espaços como FiCS, FF4D, G20 e COP30 representam oportunidades estratégicas para impulsionar a reforma do financiamento climático, já defendida na Agenda de Ação de Adis Abeba de 2015 e no Roteiro dos Bancos Multilaterais de Desenvolvimento do G20. Além disso, encontros globais e processos de formulação de políticas devem garantir que o espaço cívico seja prioridade, e que as recomendações e contribuições da sociedade civil sejam efetivamente integradas às agendas formais e aos resultados dessas conferências. Um exemplo é a Declaração da Sociedade Civil no FiCS que integra representantes da sociedade civil e das comunidades, apresentando recomendações práticas para que os Bancos Públicos de Desenvolvimento se comprometam com ações transformadoras, colocando os direitos humanos e a sustentabilidade no centro das decisões de financiamento.
A Plataforma de Green Accountability e a Comunidade de Prática (CoP) buscam reforçar o papel crítico da responsabilidade, transparência e participação no financiamento climático. Ao fortalecer a colaboração entre sociedade civil e instituições financeiras, a CoP aumentará o intercâmbio de conhecimentos sobre boas práticas de financiamento climático, do nível global ao local, e continuará a atuar como um hub de aprendizado entre pares e influência política para promover mudanças significativas na governança climática.
Sua participação nessa iniciativa transformadora ajuda a impulsionar a agenda da Green Accountability, em busca de processos de financiamento climático mais inclusivos e responsáveis.
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