Apoie a Fiquem Sabendo
Apoie agoraEquipe Fiquem Sabendo
O uso indiscriminado da expressão “sigilo de 100 anos” no debate público tem distorcido o entendimento sobre os limites legais da transparência no Brasil. Confunde a população e acostuma a sociedade com uma de sigilo muito mais ampla, genérica, indeterminada, discricionária e longa do que a Lei de Acesso à Informação (LAI) permite, de fato. Ao tratar qualquer negativa como “sigilo”, enfraquece-se a responsabilização: se tudo vira sigilo, nada é tratado como exceção grave — e isso favorece justamente quem abusa do instrumento
Além disso, essa distorção atrapalha as discussões necessárias para resolver o problema concreto: a ausência de critérios objetivos e mecanismos claros para limitar o uso da justificativa de proteção de dados pessoais. Este documento apresenta orientações para a cobertura jornalística do tema, esclarece conceitos jurídicos e propõe caminhos para qualificar o debate e fortalecer a transparência.
1. Só existem três tipos de sigilo na Lei de Acesso à Informação (LAI)
• Reservado (5 anos), Secreto (15 anos), Ultrassecreto (25 anos)
• Um dos grandes avanços da LAI foi justamente colocar prazos claros, com objeto definido e impedir sigilos eternos e indeterminados.
• Existem procedimentos para colocar uma informação sob sigilo; apenas um grupo seleto de cargos tem essa autoridade; há um responsável claro pela decisão; é preciso produzir um documento de classificação incluindo a justificativa para tal; e existem procedimentos para solicitar desclassificação antes do período.
2. Negativa de pedido de LAI não é sigilo
• Negativas em primeira e segunda instância nunca devem ser chamadas de sigilo. Só se pode falar em “sigilo” após decisão formal de classificação ou, no limite, após negativa confirmada pela CGU ou órgão superior equivalente.
3. O que é então o “sigilo de 100 anos”?
• É apenas uma das justificativas possíveis para negativa de pedido de acesso à informação, não é uma classificação de sigilo.
• É uma previsão de proteção de dados pessoais por ATÉ 100 anos.
• Referente ao artigo 31 da LAI, criado antes da promulgação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), para impedir que dados particulares de cidadãos
fossem compartilhados via LAI.
4. Toda negativa com base em informações pessoais é “sigilo de 100 anos”?
• Não, existem razões válidas para uma negativa de acesso à informação com base na proteção de dados pessoais. Por exemplo, quando alguém requisita, via LAI, o seu histórico médico.
5. O problema não é o prazo
• O problema é a falta de critérios objetivos para definir o que é “informação pessoal”.
• Não é necessário alterar o texto da Lei, basta uma atualização por meio de um decreto presidencial, indicando de forma clara as limitações temporais e de objetos, uma vez que a lei fala em “ATÉ 100 anos” e não “por 100 anos”. Abrir a LAI para discussão no Congresso é um risco enorme.
Atenciosamente,
Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji)
Agência Livre.jor de Jornalismo
Fiquem Sabendo
Open Knowledge Brasil
Dr. Gregory Michener, Professor da FGV-EBAPE
Dr. Fabiano Angélico, professor da USI (Universidade de Lugano), na Suíça
Quer fazer parte da batalha pela transparência pública?
Todas as republicações ou reportagens feitas a partir de dados/documentos liberados pela nossa equipe devem trazer o nome da Fiquem Sabendo no início do texto, com crédito para: “Fiquem Sabendo, organização sem fins lucrativos especializada em transparência pública”