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Por Raquel Lins*
No mês de maio, no dia 16, a Lei de Acesso à Informação (Lei 12.527/2011) completou 9 anos em vigor no país. Fruto da reivindicação por mais transparência de ações governamentais e de disponibilização para o cidadão das informações de caráter público, ela instituiu obrigações, prazos e procedimentos para a sua divulgação, garantindo o direito já previsto pela Constituição Federal de 1988 (art. 5º). É considerada uma das melhores leis do mundo, embora tenha sido tardiamente adotada (o Brasil foi o 90º país a decretar uma), após intensa luta de muitas entidades civis, como as pioneiras Transparência Brasil e Contas Abertas.
Obrigatória para todos os entes e Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário), essa importante Lei teve sua efetivação fragilizada durante a pandemia (o projeto Pernambuco Transparente publicou artigo a respeito) e o enfrentamento da crise segue com déficit de transparência sobre o programa de vacinação em curso nacionalmente, conforme protestos de grupos especializados. Em Pernambuco, apesar de tantos anos em vigência - quase uma década -, constata-se a lastimável falta de regulamentações em nível local e com a devida qualidade. O cenário mais preocupante é observado nos legislativos: dos 14 municípios da Região Metropolitana do Recife (foco da atuação do projeto), apenas quatro (4) câmaras municipais apresentam a regulamentação do direito em seus portais: Igarassu, Itapissuma, Olinda e Recife.
Mais, o legislativo da capital, ainda que apresente um formulário virtual para solicitação de informações, não detalha quantitativos de atendimento. De maneira geral, mesmo nos portais das prefeituras, outro grave problema ocorre: não são indicadas as autoridades responsáveis pela cadeia de respostas e nem os membros da instância máxima de decisão sobre recursos (conhecida como "Comitê da LAI") - salvo a exceção da Prefeitura da Recife e do próprio Governo Estadual. O levantamento que o Pernambuco Transparente fez nos websites permanecerá aberto, como canal fixo de encontro dos normativos, uma vez elaborados.
Pouco divulgado nos perfis oficiais de comunicação (redes sociais e afins), o serviço segue crescendo em demanda, apesar de quase desconhecido pela maior parte da população (estimada em aproximadamente 9.616.000 de habitantes) e, igualmente de profissionais, como jornalistas. No país, uma pesquisa da Abraji, divulgada em celebração ao marco de aniversário, apontou que metade dos jornalistas brasileiros nunca utilizou a Lei para reportagens e investigar questões de interesse público. O imenso potencial desse uso consta em acervo do nosso portal exclusivo sobre o universo dos dados abertos, em seções especiais sobre as referências globais em jornalismo de dados e sua conjuntura no Brasil.
Em números precisos, a Ouvidoria do Governo de Pernambuco registrou até aqui quase 9 mil pedidos e 1,6 milhão de acessos ao portal criado especificamente para atender à legislação (www.lai.pe.gov.br), e que oferece adicionalmente banco de pedidos já respondidos - uma boa prática adotada também em nível federal, pelo canal "FalaBr", gerido pela Controladoria Geral da União. Na capital, são exibidos relatórios estatísticos no portal de transparência, que documentam o histórico de requisições ao longo dos anos, inclusive indeferidas ou atendidas em atraso.
A regulamentação é fundamental para um controle social independente e qualificado, como já demonstram os trabalhos de entidades tal e qual a Associação de Ciclistas da Região Metropolitana do Recife (Ameciclo), que desenvolve estudos sobre os avanços da ciclomobilidade a partir deles e foram responsáveis, sozinhos, por mais de 300 pedidos à Prefeitura. As análises dos resultados estão à disposição em uma plataforma especial de dados da organização. A LAI pode fornecer ainda a matéria-prima para estudos acadêmicos sobre políticas públicas diversas ou obras de alto impacto urbanístico, a exemplo dos produzidos atualmente por estudantes do curso de Arquitetura da UFPE, expostos e debatidos no perfil colaborativo "Cidade Comentada", no Instagram.
O fato de muitos desses órgãos locais provavelmente ignorarem pedidos é uma deficiência persistente na implementação, apesar de que, em acordo com o artigo 32º da Lei de Acesso, a recusa de fornecer informação requerida possa ensejar abertura de ação por improbidade administrativa. Através do trabalho do Pernambuco Transparente, capacitamos audiências para formalizar denúncias de irregularidades às ouvidorias dos órgãos oficiais responsáveis, como o Ministério Público Estadual e Federal, além do Tribunal de Contas, a quem compete o julgamento da falta de transparência fiscal nos processos de apuração das contas.
Por isso, é necessário que instituições públicas reforcem a infraestrutura de suas controladorias (setores coordenadores do cumprimento à LAI), treinem os servidores com atribuição de retorno aos pedidos em secretarias ou departamentos internos, e monitorem o atendimento nos prazos determinados - até mesmo valendo-se de tecnologias e capacitações gratuitas fornecidas pela própria CGU. Nunca é demais lembrar: a transparência é um dever institucional e, um direito de todo(a)s nós.
*Raquel Lins é Cientista Política (UFPE), especialista em Planejamento e Gestão Pública (UPE), criadora do Pernambuco Transparente.
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