“O acesso a melhores dados pode influenciar o processo político", Thomas Piketty
Léo Arcoverde
Publicado em: 30/05/2015
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Atualizado em: 10/03/2023
O economista francês Thomas Piketty, professor da École d'Économie de Paris, na França. Foto: Emmanuelle Marchadour/Divulgação.
Passados mais de seis meses desde o lançamento, no Brasil, de O capital no século XXI, de Thomas Piketty, pouco se falou, nos textos de análise do livro publicados na imprensa, sobre dois temas que, apesar de não serem centrais na obra, são de grande importância: o papel da transparência e a busca pela eficiência do setor público.
Quanto à transparência, o economista francês e autor do aclamado tratado sobre a desigualdade é categórico, ao afirmar: “O acesso a melhores dados pode influenciar o processo político e o debate democrático e orientá-lo numa direção mais favorável ao interesse geral”. E ainda: “Sem informação partilhada, não poder haver democracia econômica”.
Ao defender a criação de um imposto mundial sobre o capital, para regular o capitalismo patrimonial globalizado do século XXI, Piketty argumenta que esse tributo deve "permitir que se atinja um objetivo de transparência democrática e financeira sobre os patrimônios e os ativos detidos pelos indivíduos em escala internacional".
Com isso, diz o autor, "os benefícios para a democracia seriam consideráveis". Segundo Piketty, "é muito difícil haver um debate tranquilo atual (...) enquanto reinar tamanha opacidade sobre a distribuição das riquezas e das fortunas". Em outras palavras, ele ressalta: "O debate democrático não pode se desenvolver sem uma base estatística confiável".
De acordo com Piketty, as diferentes formas de controle democrático do capital "dependem, em grande medida, do grau de informação econômica de que as pessoas dispõem". "A transparência econômica e financeira não é apenas um desafio fiscal. É também, e talvez principalmente, um desafio de governança democrática e de participação nas decisões."
Por que isso é importante?
Se pensarmos sobre essa preocupação de Piketty do ponto de vista da análise da atuação da administração pública brasileira, podemos dizer que lidamos, aqui, com uma insuficiência de dados? As informações de interesse geral que o poder público disponibiliza permitem ao cidadão formar alguma opinião sobre o que o Estado está fazendo e, assim, intervir com suas decisões (sobretudo o voto)?
O que o Fiquem Sabendo se propõe a fazer, desde que entrou no ar, é justamente contribuir, por meio da difusão de séries estatísticas, com a cultura da transparência, que ainda engatinha no Brasil. Quanto mais informações publicarmos, mais o leitor estará preparado para analisar as situações que o cerca.
É importante que se ressalte: após alternar curtos _e conturbados_ períodos democráticos e ditaduras ao longo do século XX, só em 1988 o Brasil instituiu o direito de acesso à informação em sua Constituição. E a regulamentação dessa garantia só se efetivou em maio de 2012 (24 anos depois). (Para se ter uma ideia da distância existente entre nós e os países desenvolvidos, neste aspecto, Piketty analisa, em seu livro, dados sobre a renda dos franceses que datam do século XIX, e até hoje estão disponíveis.)
"O peso do poder público nunca foi tão grande"
Um outro assunto tratado por Piketty que gostaríamos de analisar do ponto de vista da realidade brasileira é a questão de como a atuação da administração pública afeta a nossa vida. Segundo o economista francês, "o peso do poder público nunca foi tão grande".
De acordo com o autor, "o poder público nunca desempenhou um papel econômico tão importante como nas últimas décadas". Ele afirma ainda que "não há tendência de baixa perceptível, ao contrário do que às vezes ouvimos".
Na visão de Piketty, “se não nos interrogarmos continuamente sobre como tornar nossos serviços cada vez mais adaptados às necessidades públicas, (...) o consenso em torno do alto nível de arrecadação e, assim, do Estado social, deixará de existir”. Para ele, “a mediocridade dos serviços públicos contribuirá para minar a confiança no Estado”.
Isso ocorre no Brasil?
A título de contexto, cabe ressaltar que Piketty trata, em seu livro, da distribuição de riqueza nos países ricos: Estados Unidos, Reino Unido e Europa continental, basicamente.
E se essas preocupações são amplamente aceitas nos países mais desenvolvidos do mundo, hoje, há como ser diferente aqui, onde a desigualdade ostenta um nível constrangedor?
É por isso que o Fiquem Sabendo insistirá em sua missão de veicular dados sobre os diversos setores de atuação da administração pública, não abrindo mão de tentar aferir a eficiência dos serviços prestados ao cidadão, sempre ressaltando o quanto se gasta _do dinheiro do contribuinte_ em cada ação implementada pelo Estado.
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