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SEGURANÇA

98% dos suspeitos de abuso sexual no metrô em 2016 não são presos

Léo Arcoverde

Publicado em: 06/05/2016
Atualizado em: 11/09/2023
94% dos suspeitos de abuso sexual no metrô e na CPTM não são presos Interior de trem da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos); sistema metroviário registra um caso de abuso sexual a cada dois dias em São Paulo. Foto: Edson Lopes Jr./GESP (23/09/2013) Cinquenta e quatro (98%) de um total de 55 casos de abuso sexual ocorridos no metrô e na CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) não foram registrados como crime pela Polícia Civil do Estado de São Paulo. Eles foram classificados como importunação ofensiva ao pudor, contravenção penal com pena prevista pela lei de multa, em caso de condenação. Na prática, mesmo quando levados à delegacia, suspeitos desse delito não ficam presos nem respondem a um processo criminal convencional por falta de previsão legal. O outro caso foi registrado como violação sexual mediante fraude. Nenhum estupro foi contabilizado no período. É o que aponta levantamento inédito feito pelo Fiquem Sabendo com base em dados da Delpom (Delegacia de Polícia do Metropolitano), da Polícia Civil, obtidos por meio da Lei Federal nº 12.527 (Lei de Acesso à Informação). Essa delegacia é responsável por registrar e investigar os casos de abuso sexual no sistema metroviário ocorridos em toda a capital paulista. Não estão computados nesse levantamento eventuais ocorrências de violência sexual registradas por passageiras da CPTM em delegacias de outras cidades da Grande São Paulo. Entre o primeiro trimestre de 2015 e o mesmo período deste ano, os casos de abuso sexual no sistema metroferroviário paulistano cresceu 62%. Esse percentual consolida uma tendência de alta do registro desse tipo de ocorrências nos trens e nas estações. (Veja o detalhamento desses dados no infográfico abaixo.) Trens do metrô e da CPTM têm um caso de abuso sexual a cada dois dias   Esses números representam a soma anual dos termos circunstanciados e boletins de ocorrência com as três naturezas criminais mais tipificadas pela Polícia Civil em relação ao abuso sexual: importunação ofensiva ao pudor, violação sexual mediante fraude e estupro. A lei prevê uma pena de prisão de dois a seis anos para a violação sexual mediante fraude e de seis a dez anos em caso de estupro. Tanto o Metrô quanto a CPTM possuem índices altos (próximos a 90%) de detenções de suspeitos de abuso sexual nos casos em que eles são identificados pelas vítimas.

Falta de punição requer criação de novo crime, diz jurista

Na avaliação do jurista e professor de direito penal Luiz Flávio Gomes, isso só ocorre porque a lei brasileira não prevê um crime intermediário entre a importunação e o estupro. A análise foi feita quando o site publicou, em março deste ano, uma reportagem sobre esse assunto. “Pela lei, a importunação ofensiva ao pudor pressupõe que não haja toque físico. Um exemplo disso é a situação em que o homem chama a mulher de bunduda, gostosa ou qualquer outra forma que a ofenda”, diz Gomes. “Havendo toque físico, qualquer que seja ele, é estupro.” De acordo com o jurista, o fato de o estupro ter uma pena muito alta faz com que a polícia e o próprio Poder Judiciário classifiquem os casos de abuso sexual de outras formas. Assim, eles evitam que as “encoxadas” praticadas no transporte público sejam punidas como estupro. “Deveria ser criado o crime molestamento sexual, com pena de dois a seis anos, como está previsto na reforma do Código Penal, em tramitação no Senado. Como ele ainda não existe, as autoridades hoje ‘forçam a barra’, enquadrando casos de abuso sexual como violação sexual mediante fraude e importunação, quando não o são.” Pela lei, diz Gomes, a violação sexual mediante fraude se aplica a casos em que o suspeito mente para a vítima, passando-se por outra pessoa, para levá-la a fazer sexo ou praticar outro ato libidinoso com ele, por exemplo. “Não vejo como isso pode ocorrer no transporte público.”

527 mil mulheres são estupradas por ano no Brasil

De acordo com o estudo Estupro no Brasil: uma radiografia segundo os dados da Saúde, feito pelo IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), do governo federal, cerca de 527 mil mulheres são estupradas por ano em todo o país. Segundo a pesquisa (a mais aprofundada já realizada sobre o tema no Brasil), apenas 10% desses casos chegam à polícia. Os dados utilizados nesse estudo apontam que “89% das vítimas são do sexo feminino e possuem, em geral, baixa escolaridade. Do total, 70% são crianças e adolescentes”.

Por que isso é importante?

O Decreto-Lei 2.848/1940 (Código Penal) define, no seu art. 213, o crime de estupro como “constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso”. Em caso de condenação, a pena para acusados desse crime (em sua modalidade simples) varia de seis a dez anos de reclusão. Já as modalidades qualificadas (consideradas mais graves pelo legislador) de estupro preveem penas mais altas. Quando há a morte da vítima, por exemplo, a pena máxima é de 30 anos.

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