Presos do regime semiaberto trabalham em horta de presídio em Uberlândia, em Minas Gerais.
Foto: Omar Freire/Imprensa MG (02/07/2015)
Cerca de 5.700 presos que já obtiveram da Justiça o direito de progredir ao regime semiaberto ocupam presídios do regime fechado por causa da falta de vagas no sistema de cumprimento de pena mais brando no Estado de São Paulo.
É o que aponta levantamento inédito feito pelo
Fiquem Sabendo com base em dados da
Secretaria de Estado da Administração Penitenciária obtidos por meio da
Lei Federal nº 12.527/2011 (Lei de Acesso à Informação).
Os presos que formam a chamada fila do semiaberto representam 19% da atual população carcerária que cumpre pena nesse regime no Estado de São Paulo, que é de 30.402 presos.
O Estado de São Paulo possui 25.997 vagas para abrigar presos do semiaberto. Para acabar com a fila, é necessária a criação de 10.105 novas vagas. (Veja o detalhamento desses dados no infográfico abaixo.)
É um total desrespeito às leis, afirma jurista
Na avaliação do jurista e diretor-presidente do
Instituto Avante Brasil, Luiz Flávio Gomes, a existência de 5.700 presos na fila do regime semiaberto em São Paulo representa “um sistema repressivo que desrespeita a Constituição e tratados internacionais”.
“Trata-se de um total desrespeito às leis por parte do Estado. Isso incentiva todas as pessoas a não observarem a lei. E o pior de tudo: não existe uma responsabilização das autoridades”, avalia Gomes.
A fila existe. É um absurdo, diz desembargador
O professor de direito penal da
PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de SP) e desembargador do
Tribunal de Justiça paulista Guilherme de Souza Nucci disse já ter julgado vários
habeas corpus de presos da fila do regime semiaberto.
“Acho um absurdo. Tenho concedido as ordens de
habeas corpus para irem imediatamente ao regime semiaberto.”
Para o assessor jurídico nacional da
Pastoral Carcerária, Paulo Malvezzi, a fila do regime semiaberto evidencia o descumprimento, por parte do Estado, de um direito básico do preso, previsto na Constituição Federal.
Para condenados no processo do mensalão, progressão foi rápida
O ex-deputado e ex-ministro da Casa Civil José Dirceu. Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/ Agência Brasil (04/11/2014)
Quem acompanhou pela imprensa as progressões de regime dos condenados no processo do mensalão não deve encarar a rapidez daquelas transferências _feitas dentro da lei_ como uma regra aplicada à maioria dos presos brasileiros.
Se em São Paulo há 5.700 detentos na fila do semiaberto, os presos do mensalão, depois que obtiveram o direito de progredir de regime, ficaram poucos dias no regime fechado.
O ex-deputado federal e ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, por exemplo, levou sete dias para progredir, na prática, de um regime para o outro: em 25 de junho de 2014, o STF (Supremo Tribunal Federal) concedeu a ele o direito de trabalhar em um escritório de advocacia durante o dia e passar a noite na cadeia. No dia 2 julho, ele foi transferido para uma unidade do regime semiaberto em Brasília (DF).
Por que isso é importante?
O art. 185 da
Lei Federal nº 7.210/1984 (Lei de Execução Penal) determina que “haverá excesso ou desvio de execução sempre que algum ato for praticado além dos limites fixados na sentença, em normas legais ou regulamentares”
O Tribunal de Justiça de São Paulo já concedeu a presos da fila do semiaberto o direito de progredir diretamente ao regime aberto até que o Estado providenciasse uma vaga para ele no semiaberto sob o argumento de que eles não deveriam, além da pena, arcar com a “má administração e aparelhagem estatal”.
Presos devem ser transferidos em breve, afirma secretaria
A Secretaria de Estado da Administração Peninteciária disse em nota que "atualmente há cerca de 5.700 presos que se encontram em unidades penais de regime fechado, aguardando a abertura de vagas em unidades prisionais de regime semiaberto".
De acordo com a pasta, "além da construção de unidades prisionais próprias para abrigar presos condenados ou promovidos ao regime semiaberto, esta Secretaria também vem efetuando obras de ampliação nos Centros de Progressão Penitenciária já existentes, o que resultou na geração de 4.947 vagas para homens e 200 vagas para mulheres". "Também foram edificadas Alas de Progressão Penitenciária em unidades penais de regime fechado, que geraram outras 2.052 vagas para homens e 180 vagas para mulheres. Encontram-se em fase de construção mais algumas outras obras que também proporcionarão a criação de mais 804 vagas para homens e 324 vagas para mulheres, e mais 432 vagas para homens cujos processos encontram-se em trâmites administrativos."
Ainda segundo a secretaria, "há a expectativa de que os presos que aguardam o surgimento de vagas em regime semiaberto sejam removidos em breve, em face da realização de mutirões para análise dos pedidos de benefícios dos presos recolhidos nos Centros de Progressão Penitenciária de Jardinópolis, de Mongaguá e de Tremembé".