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INSTITUCIONAL

Organizações de Transparência são contrárias ao envio do PL para alterar a LAI ao Congresso

Equipe Fiquem Sabendo

Publicado em: 12/02/2025
Atualizado em: 12/02/2025

Leia a íntegra da carta da sociedade civil organizada para o Governo Lula, publicada em primeira mão na coluna da Mônica Bergamo

À Casa Civil da Presidência da República,

As organizações da sociedade civil signatárias desta carta, integrantes do Conselho de Transparência, Integridade e Combate à Corrupção (CTICC) e do Fórum de Direito de Acesso à Informações Públicas, vêm expressar sua firme oposição à proposta de alteração da Lei de Acesso à Informação (LAI) e alertar para o risco de retrocessos que tal medida impõe à transparência pública no Brasil.

Em janeiro deste ano, a Controladoria-Geral da União (CGU) apresentou à imprensa as medidas que comporiam o Projeto de Lei (PL) que, segundo o governo, seria enviado pela Casa Civil ao Congresso. A proposta do Governo Lula é abrir a LAI para discussão para alterar o artigo 31, que trata das informações pessoais. Propõe a alteração do prazo de “até 100 anos” para proteção de informações pessoais requisitadas via LAI para cinco anos após a morte do titular do dado, a inclusão de um “teste de dano” genérico para contrapor o interesse público ao direito à privacidade e que pedidos negados com base neste argumento sejam claramente demarcados.

No entanto, como já apontado pelas entidades especializadas no acesso à informação, a falta de clareza sobre a aplicação do prazo máximo de 100 anos gera mais preocupação do que a duração do sigilo em si. Além disso, as contribuições da sociedade civil no âmbito do CTICC foram ignoradas no PL elaborado pelo governo. Caso o projeto vá a tramitação, a LAI será, pela primeira vez em sua história, colocada em risco de retrocesso no Legislativo, e estará sujeita a modificações que podem comprometer seu propósito original.

A seguir, relatamos os três problemas centrais dessa proposta:

1. Abrir a LAI ao Congresso representa um risco irrecuperável

A submissão da LAI a um processo legislativo no Congresso Nacional abre margem para retrocessos graves. Alterações oportunistas e não previstas podem comprometer a transparência pública, tornando o risco muito maior do que qualquer benefício pontual que o governo busque. 


2. O “sigilo de 100 anos” não é o problema

O prazo máximo de 100 anos para restrição de acesso a informações pessoais relativas à vida privada, honra e imagem não é o centro do problema. A questão é a aplicação adotada para este trecho da LAI, derivada de uma falta de clareza sobre a necessidade de se verificar a ocorrência de interesse público sobre as informações pessoais.

Medidas para esclarecer a harmonia entre acesso à informação e proteção a dados pessoais precisam abordar e solucionar esse problema, estabelecendo diretrizes e processos claros e transparentes sobre como a decisão em relação à restrição ou liberação de informações pessoais deve se dar. Também deve deixar claro que transparência é a regra e o sigilo a exceção.  Além disso, devem já agregar claramente situações em que já há um entendimento consolidado, tal como a posição do STF ao decidir pela publicidade de dados de “agentes públicos enquanto agentes públicos mesmos”.

O próprio governo demonstra insegurança quanto ao que considera necessário mudar. A versão atual da proposta difere significativamente do Enunciado 01/2024 divulgado há apenas quatro meses, o que levanta dúvidas sobre a solidez da fundamentação técnica do PL. A justificativa para a alteração legal é enfraquecida quando o próprio entendimento que a sustenta não perdurou nem por um ano dentro da administração pública.  


3. Processo de construção sem participação efetiva

O governo frequentemente reforça a importância da participação social e do governo aberto. No entanto, esses princípios não têm sido respeitados neste processo.
Em março de 2024, a CGU acionou o Conselho de Transparência, Integridade e Combate à Corrupção (CTICC) para que apresentasse sugestões de aperfeiçoamento normativo da LAI. À época, a sociedade civil pontuou que via riscos em tentar alterar a legislação, e o governo não indicou que tomaria a iniciativa de propô-la. Meses depois, entretanto, soube-se apenas por meio da imprensa que o governo preparava um projeto de lei.

Somente em novembro, após algumas das organizações integrantes do CTICC expressarem, em carta ao ministro, seu descontentamento com a ausência reiterada de debate no colegiado sobre o PL, a CGU deu acesso ao texto com prazo exíguo para contribuições,  vedando seu compartilhamento para fora do Conselho.

As organizações aguardavam retorno do recesso para dar seguimento ao processo participativo, mas por meio do noticiário descobriu-se que o PL já estaria 'finalizado'. Se corresponderem ao que pretende o governo, as informações das reportagens indicam que as contribuições e preocupações da sociedade civil foram majoritariamente ignoradas.


Conclusão

A revisão de leis de transparência deve ser pautada pela coragem de ampliar direitos fundamentais, e não por ajustes pontuais que abrem precedentes perigosos. O texto da proposta que tivemos acesso não fortalece as instituições democráticas nem estabelece um novo marco legislativo positivo. Pelo contrário, cria um risco real de retrocessos.

Diante desse cenário, solicitamos que a Casa Civil reconsidere o envio da proposta de alteração da LAI ao Congresso Nacional.

A Lei de Acesso à Informação tem sido um pilar essencial para a democracia no Brasil. Nos últimos anos, sua aplicação garantiu a transparência de decisões governamentais, viabilizou denúncias de irregularidades e fortaleceu o controle social sobre a administração pública. Não podemos colocá-la em risco.

Atenciosamente,
Artigo 19 
Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji)
Fiquem Sabendo
Open Knowledge Brasil
Transparência Brasil
Transparência Internacional - Brasil
Dr. Gregory Michener, Professor da FGV-EBAPE
 

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